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in Estudios internacionales (Santiago)
O regime de maquila e suas implicações no México: perspectivas para o modelo adotado no Paraguai
Resumo:
Em 1960 surgiu no México um regime industrial denominado maquila, onde indústrias dos Estados Unidos se instalavam em território de fronteira mexicana para aproveitar a força de trabalho barata e incentivos fiscais para etapa de manufatura de seus produtos, além da facilidade de transporte dos produtos para dentro dos EUA. Neste trabalho, por meio de levantamento bibliográfico, análise midiática e de discursos, utilizando-se da teoria do subimperialismo, será descrito como ocorreu este processo e os impactos dele na economia e sociedade mexicana. Posteriormente, busca-se comparar com o modelo adotado pelo Paraguai compreendendo os efeitos atrelados com este modelo a longo prazo.
Introdução
No senso comum a fronteira marca uma separação, uma divisão entre dois espaços distintos, normalmente de maneira conflituosa, principalmente quando se tratando de uma fronteira geográfica entre países com estágios de desenvolvimento distintos e posições geopolíticas importantes. Este é o caso da fronteira existente no norte do México com os EUA. A desigualdade entre ambos os Estados faz este local ser visto e conhecido pela violência, tentativa de migração ilegal, contrabando e pobreza, o que muitas vezes não reflete a realidade do lugar. Não distinta desta perspectiva, tem-se a fronteira do Paraguai com o Brasil, assemelhando-se em muitos aspectos dos limites descritos.
No intuito do governo mexicano de industrializar o país e gerar empregos, surgiu a Lei da Maquila durante a década de 1960. Em linhas gerais, a prática prevê um sistema econômico e de produção que consiste em indústrias de montagem manual situadas em países com força de trabalho barata, no qual os produtos acabados têm geralmente como destino, um país desenvolvido. As empresas maquiladoras normalmente atuam no estágio de manufatura, sem muita tecnologia ou agregação de valor. A lei da Maquila possibilita às indústrias maquiladoras instaladas em seu território trazer matéria prima do seu país de origem e produzir usando a força de trabalho do país onde estão instaladas, desde que os produtos industrializados retornem para o primeiro. Neste sentido, há uma quantidade de reflexões e debates sobre a exploração dos funcionários destas empresas alocadas na fronteira mexicana com os Estados Unidos, assim como todas as outras maquiladoras pelo mundo. Outro amplo questionamento é sobre o impacto e responsabilidade ambiental e social destas empresas.
As empresas norte-americanas, contam ainda com incentivos das leis 806 e 807 de novembro de 1966 do seu país, que permite exportarem matéria prima sem taxação, desde que retornem para o país com o produto acabado, ocasião em que seria taxado apenas sobre o valor agregado ao produto final. Desta maneira, torna-se extremamente vantajoso a instalação de suas plataformas industriais em solo mexicano, usufruindo da matéria prima, equipamentos e tecnologia dos EUA, e da força de trabalho de baixo valor do país vizinho. Após acabado o produto final retorna para os EUA, onde é comercializado normalmente. Observando esta experiência, o Paraguai adotou modelo semelhante de produção no ano 2000, atraindo principalmente empresas para sua fronteira com o Brasil. Este sistema prevê que empresas se instalem em solo paraguaio, utilizem a força de trabalho do país —uma economia de aproximadamente 50% no valor final da folha de pagamento— além de um imposto único (IVA) de 1%, desde que 90% dos produtos acabados retornem para o país de origem em até dois anos.
Atualmente constata-se grandes incentivos políticos e governamentais do país neste modelo industrial. A cobertura e discursos da mídia trazem dados que indicam um grande crescimento do país após adoção de tais medidas, estes dados serão apresentados e debatidos no presente estudo. Porém, o que se iniciou no Paraguai há 10 anos e tomou força aproximadamente há 05 anos já está em vigência no México por mais de 50 anos. Neste artigo pretende-se estudar a maquila enquanto ferramenta para industrializar e desenvolver o Paraguai, mas sem perder o paralelo em relação ao caso mexicano.
Este modelo industrial incentivado pelos EUA ao redor do globo, aparece como uma maneira messiânica de industrializar os países do chamado “terceiro mundo” ou subdesenvolvidos, porém com baixo poder de competitividade no cenário global, onde, em teoria ambas as partes envolvidas seriam beneficiadas. No entanto, carece de atenção o impacto gerado por estas indústrias nos países que as sediam.
No intuito de contribuir com tal discussão, dividimos o artigo em três partes. A primeira traz à tona a Teoria Cepalina, sobretudo de Raul Prebisch, a Teoria do subimperialismo de Ruy Mauro Marini e a Teoria da Dependência, com principal autor Fernando Henrique Cardoso, observando como elas influenciaram as decisões políticas e o desenvolvimento ou subdesenvolvimento dos países da América Latina. A segunda parte discorre sobre a origem do regime maquilador e seu processo na fronteira do México com os EUA. No terceiro momento discute‑se a implementação deste regime do Paraguai, finalizando com as considerações finais, onde busca-se pensar o impacto deste modelo no desenvolvimento do Paraguai.
As teorias de desenvolvimento da américa-latina
Os estudos da CEPAL
A Cepal — Comissão Econômica para a América Latina, surgiu em fevereiro de 1948, em um momento de crise dos países subdesenvolvidos em razão dos efeitos da teoria keynesiana, de pleno emprego e de não intervenção estatal. Uma série de estudos surgiram incluindo o Estado como promotor do desenvolvimento econômico e social. Até então os mainstream dos estudos analisavam a teoria para os países desenvolvidos, como a Europa e replicavam para os países de terceiro mundo, sem considerar suas especificidades. Desta forma, bastaria os países atrasados aplicarem as mesmas medidas políticas e econômicas dos países em estágio avançado para atingir o mesmo grau de desenvolvimento em que estes últimos estavam. (Dias, 2012).
A teoria cepalina ou estruturalista critica a teoria das vantagens comparativas, conhecido também como modelo ricardiano, da qual o principal teórico foi David Ricardo. Em seu livro The Principles of Political Economy and Taxation (1817) analisou o comércio internacional e afirmou que cada país deve se especializar na produção de bens que seja relativamente mais eficiente, ou seja, o país se especializa em produzir bens com menor custo de produtividade e importar bens com maior custo de oportunidade para si. Os cepalinos discordavam desta perspectiva ao analisar que o ganho auferido com a produção de bens primários —que é o principal fator de produção na AL— é muito inferior ao da produção de bens industrializados, além disto, estes países não industrializados precisam importar produtos com um valor de mercado superior aos produtos primários exportados, gerando sempre uma desvantagem na balança comercial.
Ao tentar entender as distorções econômicas e sociais da América Latina, os autores cepalinos se depararam com dificuldades metodológicas e ausência de uma teoria real para a região, surgindo a necessidade de construir um referencial teórico moldado em função da realidade histórica e especificidades da região. Os cepalinos trouxeram uma visão estruturalista global dual, onde o mundo estaria dividido entre centros e periferias, cada qual tendo sistemas produtivos distintos. “O comércio internacional favorecia a acumulação de riqueza nos países que exportavam produtos manufaturados e importavam matéria prima, como também favorecia a acumulação de pobreza nos países que faziam o contrário” (Cervo, 2008).
O intuito dos estudos da Cepal era analisar as relações entre centro e periferia, tendo como um dos seus principais representantes o economista argentino, Raul Prebisch, que fazia uma crítica a divisão internacional do trabalho e a especialização dos mercados. Amado Cervo, (2008) explica a relação entre o maior domínio tecnológico e o rápido crescimento dos centros em razão das periferias. Em razão do desenvolvimento tecnológico as economias industrializadas —centrais— desenvolviam sua força produtiva em ritmo acelerado, beneficiando a comunidade como um todo, enquanto os países de produção primária – periféricos – as técnicas produtivas difundiam-se lentamente, vinculadas principalmente ao setor agrário e beneficiando um grupo muito pequeno da sociedade (Dias, 2012).
As oscilações do capitalismo geram impacto bem maior nas periferias, a força de trabalho nos países centrais é melhor organizada, desta maneira, quando há uma superprodução e crise econômica é difícil diminuir salários em função principalmente da pressão sindical. Desta maneira os centros forçam a redução de preço das matérias primas oriundas dos países menos desenvolvido, forçando os empregadores a diminuírem os salários ou a estabelecerem medidas protecionistas, por isso existe uma grande discrepância entre os salários da força de trabalho em economias centrais e nas periferias. Este é o principal argumento da teoria cepalina em relação a deterioração dos termos de troca, invalidando a teoria da vantagem comparativa.
Essa teoria mais tarde, é complementada por Ruy Mauro Marini no livro Dialética da Dependência (1973), em uma explicação do que seria o sub-imperialismo. De modo sucinto, a teoria aborda, além do centro e da periferia, os países intermediários, como o Brasil. Neste caso o país central domina as relações com o Estado intermediário e este replica do mesmo modo as forças opressoras em países menos desenvolvidos, como por exemplo o Paraguai. Para a teoria estruturalista, a maneira de reverter este processo seria através da industrialização. Em outras palavras, o subdesenvolvimento poderia ser superado pela capacidade de o Estado conduzir a sociedade mediante o planejamento da industrialização, à geração de empregos, à expansão do consumo em massa e do desenvolvimento tecnológico.
No entanto, os países da América Latina promoveram a industrialização por meio do modelo de substituição de importação. Ao mesmo tempo que a produtividade média destes países aumentava, diminuindo a dependência externa por bens de consumo, também aumentava a demanda por máquinas e tecnologias que precisavam ser importados dos países centrais, situação incompatível com a economia e poder das nações periféricas. Tal contradição causou endividamento e aumento da inflação dos países pobres e em desenvolvimento.
Cervo (2008) explica que a maneira de superar tais empecilhos é através da intervenção estatal direta por meio de empresas estatais, ou indiretamente por meio de ajustes e incentivos fiscais. Não suficiente, também se aceita o capital estrangeiro como uma medida protetiva. Contudo, a proteção estatal deveria ser provisória, permanecendo até durante o período em que perdurar as diferenças entre as economias centrais e periféricas.
Celso Furtado (1961), economista brasileiro, foi um grande contribuinte a teoria cepalina. Para ele era necessário engendrar aos estudos o contexto histórico por qual passaram os países periféricos, reforçando um processo distinto aos das economias europeias. Em sua obra Formação Econômica do Brasil e mais tarde em Desenvolvimento e Subdesenvolvimento Furtado retrata como a montagem de uma economia primário-exportadora, resulta de um processo histórico de expansão mercantilista europeia. (Dias, 2012)
Teoria da dependência
Outra abordagem que versa sobre a superação do subdesenvolvimento partindo da observação da realidade da América Latina, desenvolve-se em 1960 e é influenciada por três correntes: o marxismo, as teorias do imperialismo e os estudos da Cepal. Ela ficou conhecida como a Escola da Dependência.
De acordo com Amado Cervo (2008), a teoria da dependência leva em consideração os seguintes fatores: 1) o subdesenvolvimento se liga à relação de dominação e dependência entre povos; 2) é um fenômeno histórico, atrelado à evolução do capitalismo; 3) ele favorece no interior da sociedade e Estados os interesses de segmentos sociais dominantes; 4) a consciência e a cultura são ofertadas como se ambos, desenvolvimento e subdesenvolvimento fossem positivos, por fim; 5) o subdesenvolvimento impregna o poder, a política e o processo decisório e independência dependente, a economia de um país é atrelada a outrem.
O imperialismo, usualmente tido como vilão para o desenvolvimento dos países periféricos se tornou chave para a industrialização destes. Com o advento da globalização o capital das grandes corporações migrou para outros países em busca de vantagens competitivas, auxiliando no processo de industrialização. Por outro lado, levou a desnacionalização de setores industriais estratégicos para o país. Para os defensores da teoria da dependência ortodoxa, não seria possível dentro do capitalismo o desenvolvimento dos países periféricos, “apenas um desenvolvimento do subdesenvolvimento, um subcapitalismo ou um desenvolvimento dependente e associado” (Dias, 2012), já que o atraso destas nações é necessário para a expansão econômica e social dos países ricos.
Exercendo um poder imperialista sob as nações periféricas, as grandes economias mundiais subtraem destes países grande parte do excedente de riqueza, tornando insuficiente o processo de acumulação capitalista para um desenvolvimento econômico autossustentável. Essa constante exploração dos países subdesenvolvidos gera uma perda econômica por meio dos processos políticos e sociais, tais como a super-exploração do trabalho ou o sub-imperialismo (Dias, 2012). Estes países não podiam contar com a força e liderança das elites burguesas, em uma revolução nacional e democrática. Portanto, a maneira de redenção social aos povos oprimidos da América Latina seria através de uma revolução socialista.
A divisão dual do mundo e a explicação de nações pré-capitalista feudais com desenvolvimento de subsistência, não servem para explicar a realidade, estas relações desenvolvidas no plano internacional são aspectos de um processo histórico único: o processo de desenvolvimento do capitalismo (Dias, 2012). Assim, tanto as sociedades de estruturas políticos e sociais arcaicas, quanto as mais modernas seriam nações capitalistas. Os excedentes produtivos destes países satélites vão para sua metrópole e dessa para outras metrópoles. Deste modo, não seria possível qualquer mudança ou reforma nos países satélites já que o excedente econômico necessário já estava destinado as metrópoles mundiais.
Dentre os autores surge a questão de como o capitalismo se desenvolverá nestes países dependentes, já que todo o excedente de produção tinha destino as metrópoles, não havendo capital para expandir os meios de produção, a resposta vem de fenômenos típicos de sociedades dependentes, a super-exploração do trabalhador e o rebaixamento dos salários da população. Marini desenvolve melhor este aspecto, partindo também do subdesenvolvimento, explica como a inserção econômica da América Latina no mercado global permitiu o desenvolvimento do modo de produção, a mais-valia relativa, nos países centrais (Marini, 1973). De forma resumida, com a oferta dos alimentos produzidos pela América Latina no mercado global, depreciou o valor destes, reduzindo o custo de produção e permitindo a longo prazo aos capitalistas aumentarem os salários da força de trabalho - sem reduzir os lucros – majorado o poder aquisitivo e custo de vida dos trabalhadores, gerando um grande mercado consumidor interno (Dias, 2012).
Enquanto isso na América Latina, a desvalorização do valor dos produtos primários, reduziu os ganhos obtidos, forçando os capitalistas à redução dos salários, ampliação da jornada de trabalho, o que gerou uma super-exploração. Isso era possível porque os países periféricos não dependiam de um mercado interno, todo seu ganho advinha das trocas comerciais com os centros. Para Marini (1973), a única maneira verdadeira para desenvolvimento dos países da América Latina é por meio do socialismo. A abordagem de Marini (1973) tem lacunas no que se refere a explicação do desenvolvimento industrial nos países periféricos, assemelhando‑se a explicação da Cepal de substituição de importações. Por outro lado, relata ter sido uma saída importante o Brasil exportar seus produtos manufaturados para os países vizinhos, o que ele denomina como subimperialismo.
Esses conceitos trazidos são fundamentais para entendermos um pouco melhor a posição dos países da América Latina frente às economias centrais. Sabemos que a relação é desigual. O arrolamento econômico entre o México e Estados Unidos é muito semelhante ao desempenhado pelo Brasil com o Paraguai, destarte na próxima seção será apresentado o regime da maquila, o contexto em que surgiu e uma tangencial das problemáticas que poderão ser enfrentadas pelo Paraguai, já que o processo nesse país é mais recente.
A maquila
Apesar de a América Latina já estar independente em sua maioria desde o século XIX, seus países possuem níveis diferenciados de industrialização. Em linha gerais, eles começaram a industrializar-se nos moldes Europeus, porém não tinham poder para competir no mercado internacional. A teoria das vantagens comparativas de David Ricardo, argumenta que o “primeiro mundo” está fazendo o que faz de melhor, produzir e exportar produtos industrializados, enquanto o terceiro mundo se especializava na produção e exportação de matéria-prima e commodities. Nesta lógica fica difícil para os países subdesenvolvidos se industrializarem, uma vez que não têm chances no mercado internacional frente aos países já desenvolvidos.
Desta maneira, os países desenvolvidos intuíram que o restante do globo só se desenvolveria com ajuda destes. Em 1964, The United Nations’ continuing Conference on Trade and Development (UNCTAD) se reuniram em Genebra e trouxeram a abordagem da necessidade de ajudar os países do “terceiro mundo”. Assim, em 1968, a UNCTAD criou o Sistema Geral de Preferências (GSP) para garantir o acesso das exportações dos países de “terceiro mundo” para os países de “primeiro mundo”. Neste contexto, as grandes corporações internacionais passaram a investir nestes países subdesenvolvidos, atraídos principalmente pelo baixo custo da força de trabalho. Os novos países em desenvolvimento abriram suas fronteiras para estas empresas, visando a quantidade de trabalho gerado e o lucro obtido através do câmbio da moeda mais forte para a moeda local.
Alguns países obtiveram sucesso em sua industrialização por esta empreitada, como é o caso de Hong-Kong, Tailândia, Coréia do Sul e Singapura. Neste momento da história, os países do “primeiro mundo” eram melhores em produzir materiais de tecnologia avançada e de produção moderna, além de especialização científica, mantendo a engrenagem da cooperação produtiva internacional funcionando, trabalho de alta qualificação e operações de capital intensivo. Assim, o “terceiro mundo” poderia se especializar nos trabalhos de baixa e média qualificação e de alta intensidade. Deste modo, a produção global seria “dividida” para benefício mútuo e satisfação de todos.
Grande parte das offshores dos EUA estavam alocadas na Ásia, mas apesar de ser uma empreitada lucrativa, estavam começando a ter problemas de logísticas. Além disso, a lei 806.30 e 807.00 do Tariff Schedule of US (TSUS), que permite exportar matéria-prima dos EUA para ser produzida no exterior e depois reintroduzi-la no país apenas com o pagamento da taxa sobre o valor agregado ao produto, não estava sendo aproveitada em seu máximo, em razão do alto custo para as empresas levarem a matéria-prima para o exterior, produzir o produto lá e depois importar novamente o produto acabado. Tal situação levava as indústrias a comprar matéria-prima do país em que estavam sediadas ou importarem de países mais próximos.
Até então, o México tinha uma economia protecionista, mas na tentativa de gerar empregos e suprir uma demanda de demarcação de fronteira tomou uma medida antagônica a esta perspectiva. Assim, abriu de maneira temporária o território para empresas de capital estrangeiro que quisessem produzir seus produtos utilizando a força de trabalho existente no país. Desta forma, as indústrias que foram se instalando e produzindo sempre eram consideradas como transitórias, em uma situação de exceção (Contreras, 2000). Nesta perspectiva o México ganharia pelos empregos gerados e pelo lucro obtido através do câmbio da moeda americana, dólar, para pesos mexicanos, além disto apostavam que a matéria-prima seria adquirida do país.
Estas indústrias ficaram conhecidas pelo nome em Espanhol maquiladora, que, em sua origem colonial, corresponderia a porção de farinha que o moleiro garantia após moer o milho. Nesta analogia, os EUA fornecem o milho (matéria-prima), o México fica com um pouco da farinha (lucro sobre o câmbio de dólares para pesos e os salários dos funcionários) e a farinha (produto final) volta para os EUA e normalmente é vendido para os trabalhadores da maquila que regularmente gastam parte do seu salário naquele país.
Neste contexto, diferente do que ocorria no caso asiático, as indústrias americanas se beneficiavam inteiramente das leis 806/807 devido a facilidade em atravessar a matéria-prima pela fronteira, em produzir seus produtos naquele país, com um custo de força de trabalho inferior, para, no fim do processo, exportarem os produtos acabados para os EUA, com taxas incidindo apenas sobre o valor agregado no produto. É importante ressaltar que os principais beneficiários desta modalidade de produção são as grandes corporações internacionais, onde a Panasonic, a Lexmarc, a Sony são alguns exemplos, além de um grupo seleto da elite do país mexicano.
Em 1994 foi criado o NAFTA—Tratado Norte-Americano de Livre Comércio, composto pelos EUA, México e Canadá. Com o advento do Nafta, o fenômeno da maquila ganhou força devido à inexistência de tarifas entre os três países, favorecendo a importação de componentes e a exportação de produtos acabados. Algumas potências, especialmente os Estados Unidos, as utilizaram para melhorar sua competitividade internacional com os privilégios que lhes foram oferecidos por diversos governos mexicanos. Alguns teóricos, como Gruben e Kiser (2001), alegam que não foi o NAFTA responsável pelo crescimento da maquila no período de 1994–2000 e sim diversos fatores, como o fortalecimento da economia norte-americana e a desvalorização do peso mexicano.
O NAFTA surgiu propondo que o acordo aliviaria muitos dos problemas da fronteira causados pela zona franca, aprimorando as leis trabalhistas e ambientais, além de diminuir a alta concentração de maquiladoras ao longo do território fronteiriço (Public Citizen, 2000). Contudo, o NAFTA não teve o efeito proposto. Até os anos 2000 a força de trabalho nas maquilas ampliou-se em cerca de 110% (Sargent y Matthews 2003), poucas maquiladoras se espalharam pelo território, a maior concentração permaneceu na região de fronteira. Em 1995, 85% dos trabalhadores de maquila estavam empregados em um dos seis estados de fronteira do México (Public Citizen, 2000). Outro ponto negativo do NAFTA foi na questão ambiental. Originalmente no sistema maquilador, as indústrias eram obrigadas a retornar todo material tóxico e resíduos para a matriz no EUA, após o NAFTA permitiuse o descarte no país em que estavam alocados (EHC, 2000).
Neste contexto, as empresas maquiladoras apresentaram um período de crescimento, em 1990 eram 1500 estabelecimentos, já em 2001 eram mais de 3700. Além do aumento desta atividade relacionado ao NAFTA, também há uma ligação com a desvalorização da moeda nacional, o peso, pois percebe‑se ciclos de aumento de investimentos quando há desvalorização da moeda. Quanto a distribuição destas indústrias no território nacional, em 1990 apenas 15% estavam alocadas distante do espaço fronteiriço, já em 2000 essa porcentagem passava de 27,5%. Em relação ao montante de exportação, nos anos 1980 a maquila representava 10% do total exportado, em 2000 estava em 45%, em contrapartida há uma importação dos EUA de aproximadamente 30%. A relação produtiva entre os dois países ficou entrelaçada de tal modo que Villafañe (2004) descreve a fronteira mexicana como um espaço produtivo da economia dos Estados Unidos.
As expectativas, mesmo com as oscilações expostas anteriormente podem ser claramente visualizadas na alteração no decreto para el fomento y operación de la Industria Maquiladora de Exportación emitido em 1 de junho de 1998 e publicado no Diário Oficial da Federação mexicana. O documento mostra algumas preocupações e a mudança de enfoque governo quanto ao resultado esperado pelas industrias maquiladoras do território:
“Las empresas maquiladoras de exportación deberán atender a las siguientes prioridades nacionales: crear fuentes de empleo; fortalecer la balanza comercial del país a través de una mayor aportación neta de divisas; contribuir a una mayor integración interindustrial y coadyuvar a elevar la competitividad internacional de la industria nacional, y elevar la capacitación de los trabajadores e impulsar el desarrollo y la transferencia de tecnología en el país” (Diario Oficial de la Federación el 1 de junio de 1998).
Apesar desta preocupação, a partir de 2003, percebe-se uma queda no processo industrial maquilador, quase 1.000 indústrias a menos que em 2001. Villafañe (2004) atribui este acontecimento a dois fatores: primeiro a queda na atividade econômica dos EUA; e depois a migração da economia para a China, o que atraiu investidores com valores menores da força de trabalho e representou a volatilidade destas indústrias, sem impedimentos de migrar para outro país com melhores condições.
Em 2006 o governo mexicano criou o IMM EX (Manufacturing, Maquiladora and Export Services Industry Program) no qual em 2008 foi responsável por 76% de toda exportação de manufaturados do país. A grande questão em torno da maquila é em relação ao trabalho de manufatura, que exige força de trabalho desqualificada e barata, gerando pouco valor agregado, além dos baixos salários pagos, exploração dos funcionários e os danos ambientais causados, além da grande dependência econômica do país em uma atividade marcada pela volatilidade característica destas indústrias.
Através de informações da mídia, discursos e diversos artigos nacionais mexicano, visualiza-se que a maioria dos trabalhadores da maquila, são mulheres, novas, indígenas, pessoas de baixa ou sem escolaridade básica, muitos sequer têm domínio do idioma, pois falam o dialeto local1. Os direitos, apesar de existirem no papel, não acontecem na prática. É comum o trabalho infantil neste segmento. Apesar de a regulamentação mexicana permitir o trabalho a partir dos 16 anos, não é incomum observar documentos forjados para crianças trabalharem nas maquiladoras (MLNA, 1999). Os empregadores buscam um perfil de funcionário de pessoas submissas, dispostas a acatar qualquer ordem, sem horários definidos, com salários baixos e sem plano de saúde. Destarte, existe a conhecida e temida “lista negra”, onde os nomes dos funcionários “revoltosos” –aqueles que exigem algum direito– são compartilhados entre as empresas, para impedir a contratação de funcionários causadores de problemas.
O salário de um funcionário de maquila é de aproximadamente R$13,002 por dia, como pode ser visto em reportagem de Alba Calderón (2015) ao jornal El Universal3: “Miriam Delgado... Desde hace cinco años y medio trabaja en una maquiladora de Lexmark, en ciudad de Juárez, empaquetando catuchos de tinta para su venta. Su sueldo es de 87 pesos diários”. Em uma reportagem do jornal Telesur (2016)4, o jornalista Pedro Martínez entrevista mulheres que narram a situação de precariedade a que estão submetidas ao relatarem que não são autorizadas a usarem o banheiro e comparam a maquila como uma forma de escravidão moderna. Portanto, mesmo conhecendo seus direitos, os funcionários aceitam os ataques dos empregadores, pois precisam daquilo para sobreviver, sabendo que há poucas alternativas de emprego além daquela. Já que entre as empresas instaladas ali, há uma espécie de tabelamento de salários e condições, não havendo distinções entre elas. Em resumo, as maquiladoras pagam menos impostos que as empresas mexicanas, utilizam uma força de trabalho muito barata e possuem regulamentações ambientais que nunca são cumpridas. A falta de cumprimento dessa legislação permite às indústrias reduzirem custos enquanto contaminam a vida dos trabalhadores, a terra e os animais que vivem próximos das zonas industriais das maquiladoras.
Assim, é perceptível no México, que estas indústrias maquiladoras não atendem aos interesses sociais do país, ao contrário, são responsáveis por várias reclamações de exploração dos trabalhadores e de descumprimento da legislação ambiental, além disso, há uma grande insegurança por sua volatilidade. Se outro mercado oferecer melhores condições, facilmente a indústria fecha suas portas e migra. Percebe-se a ascensão da China no mercado mundial, afetando severamente os países dependentes de manufatura e de processos de exportação com elevada utilização de força de trabalho (Blázquez, Rodríguez y Santiso 2006; Dussel 2004). Depois de quase 50 anos de funcionamento do programa maquilador, o teor médio de utilização de insumos nacionais é inferior a 5%, e apesar do progresso indubitável na mudança para operações de fabricação de alta tecnologia e algumas atividades de design, pesquisa e desenvolvimento, ainda não existe uma estratégia em si para desenvolver uma indústria competitiva, com base em processos de alto valor agregado e conhecimento.
Enquanto no México há um amplo questionamento sobre o futuro da Maquila, o mesmo regime é criado no Paraguai, permitindo desde 2001 que indústrias estrangeiras (principalmente brasileiras) se instalem neste território, com uma tributação única de 1% sobre o valor agregado (aluguel, força de trabalho, compra de maquinários, etc.), sendo que parte deste valor ainda pode ser revertido para a indústria, importação livre de impostos e baixo custo de força de trabalho, desde que no mínimo 90% dos produtos acabados sejam exportados para o país de origem dentro de 2 anos.
O Paraguai
Observamos duas importantes correntes teóricas que versam sobre o desenvolvimento da América-Latina —Teoria da dependência e a Teoria da Cepal—, ambas relacionam o atual estágio de subdesenvolvimento ao contexto histórico. Deste modo, entendemos como necessário fazer uma breve contextualização histórica do Paraguai e fenômenos que são determinantes para a realidade atual.
As grandes navegações europeias do século XV levaram a colonização dos territórios da América do Sul, o Paraguai por sua vez, ficou sob domínio da coroa espanhola. Para manter o controle do território e “domesticar” a população nativa, foi enviada uma comitiva jesuítica ao país. As missões jesuíticas, iniciadas no começo do século XVII, tinham por objetivo “domesticar” e organizar as tribos indígenas rebeldes, manter o povo submetido ao poder de dominação colonial. A Companhia de Jesus, foi uma organização coorporativa feudal, que mantinha um regime de trabalho do tipo feudal-patriarcal com os guaranis. (Creydt, 2007). Após já terem cumprido seu papel, em 1640 iniciaram-se movimentos revolucionários para expulsar a companhia jesuítica dos territórios dominados.
Milda Rivarola (2016), apresenta uma sociedade paraguaia dividida por classes, inicialmente considerando fatores raciais. No final do século XVII, quatro em cada cinco paraguaios eram indígenas. Durante o século XVIII vários fatores alteram a demografia do país, a expulsão dos jesuítas provocou a evasão dos guaranis a outras províncias do Sul, o extermínio das minas ervateiras e as fugas pelas embarcações diminuíram significativamente o número de nativos guaranis e aumentou o número de escravos negros. Neste século o censo de Aguirre e Azara mostram que 57% da população era espanhola, 29% indígenas e 11% negros (Rivarola, 2016. p.62).
O acesso à educação na época era um privilégio de mestiços e crioulos de classe alta, os casamentos não podiam acontecer entre pessoas de castas distintas sem autorização. O cenário começa a mudar quando a participação dos negros livres e índios foi autorizada no serviço militar, o Estado domesticou os campesinos paraguaios através da guerra, convocando-os forçosamente a lutar. A derrota na guerra contra a Tríplice Aliança, pôs fim a Primeira República e ao regime de castas, os censos e as leis já não eram mais separadas pela linhagem do cidadão. A reforma de 1848, que liquidou as comunidades unificou de vez a nação, suprimindo definitivamente a divisão de castas e transformando os guaranis em cidadãos paraguaios (Creydt, 2007).
No entanto, ainda hoje, estes fatores históricos de formação da sociedade são relatados dentro do cotidiano paraguaio. Pedroso (2016) denuncia que o Paraguai é dominado por uma elite rural, a qual determina políticas e aumenta as desigualdades no país. Neste sentido, aponta que quando houve uma tentativa de questionar o crescimento das desigualdades, rapidamente foi organizado o golpe parlamentar de 2012. “El proyecto territorial de las clases y grupos dominantes es excluir totalmente a campesinos e indígenas, percibidos como los que sobran, los que estorban el desarrollo rural, y el Ministro de Agricultura, (…), insiste en que la economía campesina no es viable” (Pedroso, 2016. p. 101). Ainda neste sentido, um estudo do PNUD em 2008 revelou a língua materna como geradora de desigualdades na dimensão social. A população de língua guarani, acumula desvantagens na educação, saúde, habitação, assistência social e condições de emprego (PNUD, 2008).
A Guerra do Paraguai (1864 a 1870), conhecida como um dos mais sangrentos conflitos da América do Sul, teve grande impacto na história paraguaia. O conflito, que envolvia o interesse pelo acesso paraguaio à navegação do Rio da Prata, deixou o saldo de aproximadamente 70 mil vítimas do lado da Tríplice Aliança (Brasil, Argentina e Uruguai) e 300 mil paraguaios mortos, além de perdas territoriais, fatos que muitos nacionais acreditam ter prejudicado —e ainda prejudicar— o desenvolvimento econômico do país e suas relações com os países vizinhos. Segundo Creydt (2007), um escritor paraguaio, “el imperio del Brasil decidió aprovechar su nueva alianza con Buenos Aires para destruir el Estado nacional paraguayo…”
Percebe-se na citação do escritor, a existência de um ressentimento em relação ao Brasil. Pedroso (2016. p.91) descreve o Paraguai como uma extensão produtiva do Brasil, isto pode ser observado em vários momentos, principalmente pela quantidade de brasileiros atuantes hoje na agricultura deste país.
La presencia de capital y empresarios brasileños, se expresa en el acaparamiento de tierra básicamente en los departamentos fronterizos. En el departamento de Alto Paraná en el 2008 el 62,5% de la fincas mayores a mil hectáreas era de extranjeros, de los cuales el 55% era de brasileños; en Canindeyú la proporción de brasileños entre los propietarios de más de mil hectáreas llegaba al 60% (Pedroso, 2016. p. 90).
Como em muitos países da América Latina, o país é essencialmente agrícola, Segundo dados da Atlas of Economic Complexity da Universidade de Harvard, em 2014 as exportações de bens primários com baixo valor agregado totalizavam mais de 80% do total, as importações por sua vez, remetem principalmente a produtos industrializados de alto valor agregado. Economicamente é altamente dependente do Brasil, conforme pode ser verificado pelas transações econômicas desiguais envolvendo os dois países, caracterizando, como explica Marini (1973), uma relação sumbimperialista.
El proceso de mayor sometimiento, tanto a los intereses norteamericanos como al subimperialismo brasileño, se intensifica durante la larga dictadura del Gral. Stroessner. El régimen autoritario deja un modelo productivo dependiente de los intereses brasileños, las fronteras vivas descriptas y la fuertísima presencia brasileña en el territorio y en la economía nacional (Palau, 2016. p.109).
O Paraguai é um dos países menos desenvolvidos da América Latina, considerado um dos mais corruptos do mundo. Em um estudo feito pela Organização Da Transparência Internacional, o país aparece na 130º posição, de um total de 160 posições na percepção de corrupção. A quantidade de multimilionários aumentou no país, e esta minoria controla 90% do PIB (Borda, 2014). O gasto social per capta chega a US$ 133, aproximadamente 10 vezes menor que em outros países da região (CEPAL, 2010). Um Estado governado por uma minoria e para uma minoria apenas aumentam estas desigualdades.
A Usina Hidrelétrica de Itaipu pode ser mais uma demonstração dessa relação de dominação subimperialista do Brasil no Paraguai. A Itaipu, construída durante o regime militar deixou o Paraguai altamente endividado:
Atualmente, o Paraguai utiliza somente 5% dos 50% aos quais tem direito em energia produzida. Todavia, essa quantidade representa 95% do total de energia consumida pelo Paraguai. A parte não utilizada é vendida exclusivamente ao Brasil, por força do Tratado de 1973, por US$1,5 bilhão de dólares por ano. Deste montante, é descontado US$1,1 bilhão para pagamento do empréstimo contraído em nome do Paraguai e garantido pelo Brasil. Portanto, Assunção recebe o montante líquido anual de US$400 milhões. (Seitenfus, p.9, nota de rodapé. Declaração publicada pela agência EFE, em 22 de abril de 2008)
Por outro lado, observa-se que as vielas tumultuadas de Ciudad Del Leste oferecem uma oportunidade de crescimento econômico. Teve seu auge do seu comércio em 1990, quando comboios de sacoleiros5 vinham de diversas regiões do Brasil para aquisição de mercadorias. Contudo, após um grande trabalho de acirramento de fiscalização na fronteira pelo governo brasileiro tal atividade reduziu-se e o fluxo fronteiriço também. Atrelado ao câmbio do dólar, vários empresários da cidade vizinha reclamam a falta de movimento no comércio, situação que possibilita a observação de um número de empresas que encerraram as atividades. Reportagem do jornal Ultima Hora de maio de 20146 trazem dados da prefeitura de CDE, onde apontam que entre 2012 a 2014 mais de 1.000 empresas haviam fechado as portas em CD E, vinculando o fim desta “era de ouro” ao aumento da fiscalização no Brasil, ao câmbio do dólar e pela economia nacional brasileira (Gutiérrez e Ferreira, 2014).
A agricultura traz mais um entrave para o desenvolvimento do país, a não geração de empregos, já que se requer um trabalhador para 1.000 hectares de cultivo (Pedroso, 2016. p. 90). Enquanto outros países da América Latina desenvolveram suas industrias na década de 1990, o Paraguai se estagnou. Como mostra Tomás Palau:
“A diferencia de la mayoría de los países de la región —algunos antes y otros después— que de alguna manera atravesaron desde comienzos del siglo pasado por un proceso de industrialización y, posteriormente, de industrialización sustitutiva de importaciones, Paraguay pasó de un modelo dependiente de las exportaciones primarias a otro distinto, pero también de casi exclusiva actividad primaria. En consecuencia, aquellas formas de producción y acumulación, mitad feudales mitad capitalistas, se mantuvieron vigentes hasta hace muy poco (muchos opinan que hasta ahora)” (Palau, 2012, p. 108–109).
Levando em consideração o processo histórico exposto, dentro de uma perspectiva estruturalista é fundamental a industrialização para o desenvolvimento do país. Portanto, poderia se considerar o regime de maquila como uma alternativa para o desenvolvimento do país. A carga tributária do Paraguai é a menor da América Latina segundo dados do Banco Mundial de 2006. Conforme demonstrado na Figura 1, o custo da energia elétrica é a mais barata do MERCOSUL, em torno de 63% menor do Brasil. O imposto na folha de pagamento é em torno de 35%, distinto dos 110% cobrados no Brasil. Qualquer produto produzido na maquila, pode utilizar até 60% da sua composição de matéria prima importada de qualquer lugar do mundo e ainda terá o selo de produzida no MERCOSUL, com taxa 0 (zero) para exportar para o Brasil e Argentina.
A Lei 1.064/97 chamada Lei de Maquila, promulgada pelo Decreto 9.585/2000 no Paraguai, tem como órgão executor e regulador das indústrias maquiladoras o CNIME —Conselho Nacional das Indústrias Maquiladoras e Exportadoras— pertencente ao Ministério de Indústria e Comércio do país e age em compasso com o Tratado do MERCOSUL, numa perspectiva de fomento ao desenvolvimento regional, com o objetivo principal de atrair investidores, principalmente regionais, para manufaturar seus produtos no Paraguai.
Apesar de por lei ser permitido a estas indústrias se instalarem em todo território nacional, a maioria se fixou na região de fronteira de Ciudad Del Este e Hernadarias, atualmente o parque industrial conta com aproximadamente 60 indústrias, conforme dados da câmara de empresas maquiladoras (CEMAP) de novembro de 2015. As exportações do país entre janeiro a junho de 2015 somaram USD 139,5 milhões, 25% a mais que no mesmo período do ano anterior, conforme o Ministério da Indústria e Comércio (MIC). Os principais produtos exportados são do ramo de confecção e têxtil, seguido de peças de veículos e cabos. E o destino final de 90% destes produtos são para o Mercosul, principalmente Brasil e Argentina.
O ministro da Indústria e Comércio, em entrevista cedida no dia 07 de setembro de 2016 para o jornal paraguaio La Nación, demonstrou a importância do regime de maquila para o país. Na sua opinião, as empresas operantes neste regime, ofertam em torno de 11 mil postos de trabalho, o que lhe permitiu afirmar que o “Paraguay está imponiéndose por costo, por precio, y por calidad en el mercado mundial”. De modo complementar, mas em outra ocasião, o economista Michael Porter, afirmou que “se no Brasil tudo está complicado e na Argentina também, isso é muito positivo para o Paraguai” (Presse, 2013).
O professor da Escola de Negócios de Harvard e presidente do Instituto para a Estratégia e Competitividade se reuniu em setembro de 2013 com o presidente do Paraguai, Horacio Cartes, e sua equipe econômica, relatou conhecer a situação macroeconômica e política do Paraguai e sua posição geopolítica entre os dois grandes países da América do Sul e que se facilitar o ambiente de negócios, poderia se transformar muito cedo em uma ponte dinâmica entre eles. “Tem que construir um lugar de fácil acesso para as empresas, que proteja seus investimentos, com regras claras. O Paraguai tem que aproveitar esta conjuntura”, lembrou o especialista, recomendando aumentar as receitas e impulsionar o progresso social7.
O professor de Comércio Internacional da Universidade Autônoma de Assunção, Jesús Ángel Martín declarou à agência EFE (Carneri, 2013) que “a maquila é positiva para a etapa inicial do desenvolvimento de um país, é um pequeno passo adiante para a indústria incipiente paraguaia, mas a longo prazo não é a solução, porque se cria uma classe trabalhadora com condições mais que questionáveis”. Segundo o especialista, “o precedente imediato é o México, que criou um tecido industrial de unidades de montagem” e atraiu 99% de investimentos estrangeiros provenientes dos EUA. Continua, “mas tem coisas boas e más, você consegue criar uma indústria, mas os imensos benefícios não voltam ao país de origem, os funcionários mexicanos trabalham em uma situação muito dura e não há transmissão de tecnologia da matriz”, argumentou.
Neste contexto, afirmamos que a dependência histórica do Paraguai com o Brasil caracteriza uma relação subimperialista e essa dominação se fortalece com o regime da maquila. Por mais que houve um aumento no PIB nos últimos anos, não é possível garantir a diminuição das desigualdades no país, ao contrário, como exposto ao longo do texto as elites ficam mais ricas enquanto a população pobre permanece assim. O estudo da Unesco de 2015, revelam um número muito alto de analfabetismo em relação as metas de educação, informação preocupante quando se pensa em desenvolvimento da nação, por exemplo.
Em um país onde a corrupção é comum, há precariedade na educação e no sistema social do país, uma forte desigualdade entre as classes sociais, a maquila não pode ser pensada como maneira exclusiva de desenvolvimento do país. Ela requer uma força de trabalho barata para garantir o lucro das indústrias, gerando a longo prazo uma superexploração de uma força de trabalho desqualificada. As matérias primas destas empresas não serão adquiridas necessariamente do Paraguai e o lucro das empresas são investidos no país de origem, o imposto cobrado é baixo, e parte dele ainda pode ser revertido para a empresa, sem mencionar os danos ambientais causados e muitas vezes não considerados.
Considerações finais
Verifica-se que a América Latina possui uma história particular, seu atual estágio de desenvolvimento, ou subdesenvolvimento, não pode ser considerado isoladamente, muito menos comparado com nações centrais. A colonização e expropriação inicial destes territórios foi o que permitiu as economias centrais se estabelecerem como tal e marcou o papel de inferioridade dos países da América do Sul, principalmente de abastecedores daqueles. A teoria cepalina e da dependência trazem à baila uma análise específica destes países da América Latina, analisando seus processos de industrialização. Percebe-se que dentro do atual sistema capitalista essas nações periféricas são necessárias para o desenvolvimento da economia global e dentro deste sistema dificilmente será possível alcançar o verdadeiro desenvolvimento dos países, talvez um desenvolvimento do subdesenvolvimento (Dias, 2012).
A partir desta análise, nos corrobora Ruy Marini (1973) com a teoria do subimperialismo, a qual explica muitos fatores da relação do Brasil com o Paraguai. Além da divisão dual do mundo, de economias centrais e periféricas, existem as economias intermediárias. Estas recebem a exploração das economias centrais, mas do mesmo modo exercem uma força imperialista sobre economias mais débeis. Durante o texto foram expostos os casos que evidenciam isso, como a usina de Itaipu, a quantidade de terras em posse de brasileiros no Paraguai e a própria relação comercial de importação e exportação entre ambos, gerando uma grande dependência do Paraguai em relação ao Brasil. Essa mesma dependência é observada na relação entre México e Estados Unidos, sendo praticamente uma extensão produtiva dos EUA. A fronteira existente lá e aqui são retratadas de forma semelhante, como violentas, marginais e pobres. Uma imagem estereotipada e construída que muitas vezes destoa da realidade.
Neste contexto de superexploração, surge um modelo industrial conhecido como maquila, que serviria para o desenvolvimento do México. Através dela é possível que industrias dos EUA se instalem em território mexicano, realizem a etapa de manufatura utilizando a força de trabalho do país sediado e exportem seus produtos outra vez para venda em solo americano. Alguns apontamentos foram realizados em relação a este processo. Primeiramente, estas indústrias em sua grande maioria permaneceram na região de fronteira, não se deslocaram para o interior do país. Segundo, elas não utilizam a matéria prima do país sediado, beneficiadas pelas leis americanas 806 e 807, trazem a matéria prima dos EUA. Terceiro, existe um problema grave em relação a contaminação ambiental causado pelas maquiladoras, agravado pelo NAFTA, uma vez que depois de sua criação, as empresas podem despejar seus resíduos tóxicos no México e não cumprem as legislações vigentes. Quarto, existe a exploração da força de trabalho, estas industrias realizam uma padronização de pagamentos e condições de trabalho, tirando a alternativa do funcionário granjear algo melhor, há o tabelamento de salários além de uma lista negra que contém o nome de qualquer funcionário que reclame seus direitos, além de mínimas condições no ambiente de trabalho, como falta de calefação no inverno ou de ar condicionado no verão.
Natural dentro do sistema capitalista a mobilidade do capital. Buscando maior lucratividade é normal estas indústrias fecharem as portas e se mudarem em busca de melhores oportunidades, tal movimento é acentuado entre as maquiladoras. No Paraguai em 2001 foi sancionada a lei que permite o processo maquilador no país e tem sido altamente incentivado pelo governo como uma tentativa de desenvolver e industrializar o país. Apesar de indústrias de qualquer lugar no mundo poderem utilizar as vantagens do modelo, a maioria delas são brasileiras e de forma semelhante ao México têm se instalado nas regiões de fronteira. Estas industrias se beneficiam de maneira ampla, primeiramente pelo valor inferior da força de trabalho e da carga tributária incidente sobre a folha de pagamento, igualmente o valor da energia elétrica é um dos menores no MERCOSUL. O imposto cobrado é de 1% sobre o valor agregado ao produto, sendo que existem mecanismos para reverter parte deste recurso para a empresa. O Paraguai se beneficia do SGP, garantindo uma facilidade para exportar para economias centrais e os produtos acabados que retornam para o Brasil são isentos de tributação.
Essa tentativa de desenvolver pela maquila é uma empreitada arriscada. Observou-se no México que não logrou êxito a longo prazo. O Paraguai adotando modelo e práticas semelhantes tem grandes possibilidades de atingir resultados similares. O país precisa investir em medidas para industrialização, uma vez que se observa que grande parte de sua economia é relacionada a produtos primários, sem valor agregado. No entanto, a maquila representa a busca por maior lucratividade para as indústrias, que irão se instalar no solo do país receptor e sugar todos os benefícios possíveis, porém os investimentos de seus lucros serão realizados no seu país de origem. A força de trabalho requerida para trabalhar nas atividades é aquela não especializada, portanto o valor pago sempre será inferior.
Apesar de haver um aumento no PIB paraguaio, que para muitos está relacionado com a atividade maquiladora, esse processo requer uma avaliação mais minuciosa. O que pode representar um avanço inicial, a longo prazo pode acarretar em retrocesso, reforçando a dependência do Paraguai com o Brasil, acentuando a relação subimperialista existente. Portanto, é importante cautela e uma análise mais profunda da maquila no país, sendo ingênuo acreditar que ela por si só resolverá o atraso econômico e social existente. É um avanço e uma medida efetiva na geração de empregos, mas para o sucesso deste regime na industrialização do Paraguai, é necessário pensar e aplicar outras medidas, para não ocasionar uma exploração da força de trabalho inexperiente, que suga os recursos do país, investindo seus lucros nos países de origem, deixando um rastro caótico com os passar do tempo.
Resumo:
Introdução
As teorias de desenvolvimento da américa-latina
Os estudos da CEPAL
Teoria da dependência
A maquila
O Paraguai
Considerações finais